Groupe decolonial de traduction

 

 

Paris, 10 de janeiro de 2015

 

 

Não à “união nacional” por trás dos imperialistas! Sim à “união política” antiracista e anti-imperialista!

 

Falando sobre a carnificina que ocorreu em Charlie Hebdo na BFM/RMC, Jeannette Bougrab, antiga Secretária de Estado durante a presidência de Nicolas Sarkozy, declarou: "Eu acho que há uma responsabilidade". Ela evoca inclusive "alguns movimentos de esquerda", os "Y’a Bon Awards", e acrescenta: "os Indígenas da República são culpados (...) eles acusaram várias vezes a Charlie Hebdo de islamofobia".

Senhora Bougrab chega a ponto de exortar o Estado a adotar medidas ainda mais severas: "as medidas legislativas, ela diz, não são suficientes" diante daquilo que ela considera como uma "guerra declarada". Ele reiterou essas acusações no Grande Jornal do Canal + no dia 9 de janeiro. É de se questionar se não estaria Caroline Fourest a murmurar nos ouvidos da senhora Bougrab, ela que acaba de declarar que "aqueles que denunciam a islamofobia armaram o braço dos assassinos".

Essa violenta acusação contra o PIR, mas também contra os Y’a Bon Awards, destina-se claramente a acabar com os raros espaços políticos da imigração que, sabemos, não se dobrarão diante da injunção à “união nacional” e cujo combate contra a islamofobia, juntamente com grande parte das forças antiracistas, começa a dar frutos tanto no plano nacional quanto internacional.

A amálgama tão estúpida quanto vergonhosa de Christophe Ramaux nas colunas do Monde é, do ponto de vista dessa estratégia, extremamente transparente. De forma deplorável, ele declara: “Como explicar que os dirigentes do Attac, do NPA, jornalistas do Politis e outros – uns e outros organizaram com os Indígenas da República e o Mediapart uma jornada contra a islamofobia no dia 13 de dezembro de 2014 – puderam alimentar essa infâmia? Como explicar que alguns animadores dos Economistas aterrados tenham rejeitado a colaboração de Charb sob pretexto de que ele era islamofóbico?”.

Do mesmo modo que um Ivan Rioufol que “cita”, ao vivo na RTL, Rokhaya Diallo de se “dessolidarizar” publicamente desse atentado porque ela é muçulmana, nós estamos sujeitos permanentemente à imposição racista de ter que provar a clareza de nossas posições. No entanto, assim como a maior parte das organizações muçulmanas, nós condenamos com a maior firmeza o tiroteio mortífero contra Charlie Hebdo, assim como lamentamos as outras 5 novas vítimas dessa loucura cega. Além disso, seus autores agiram claramente contra os interesses dos muçulmanos e dos moradores dos bairros.

As declarações da senhora Bougrab não são improvisadas e respondem à expectativa daqueles que, longe de ter meditado sobre a tragédia de Charlie Hebdo, longe de buscarem soluções políticas, são eles mesmos os criadores do cenário em que a tragédia se desenrolou. No fundo, eles têm consciência dessa verdade: são eles que, por causa de seus excessos e seus encorajamentos à islamofobia, vêm alimentando esse clima doentio há muitos anos, enquanto que, inversamente, de nossa parte, nós não cessamos de alertar contra esse tipo de procedimentos fatais. Ao nos apontar os dedos, eles esperam assim desviar o olhar de suas próprias responsabilidades ou de sua cumplicidade passiva. Em outros termos, eles atacam por antecipação para não ter que prestar contas sobre as pesadas consequências de uma política da qual participaram amplamente.

Assim, afirmamos que a luta contra a islamofobia e o racismo de Estado não apenas não se abala de forma alguma com esse acontecimento, mas, pelo contrário, se fortalece.

 É necessário lembrar que dezenas de mesquitas são profanadas a cada ano por todo o país há anos? É preciso lembrar que dezenas de muçulmanos e, sobretudo, muçulmanas, culpados simplesmente de serem eles mesmos, são, dia após dia, atacados não apenas em seus bens, mas também em seus corpos? Insultados, ameaçados, agredidos fisicamente e até mortos como foi o caso da jovem Maroua na Alemanha, mas também na França em Argenteuil quando, há dois anos, atacada por skinheads, uma jovem muçulmana grávida perdeu seu bebê? É necessário lembrar que, por toda a Europa, grupos neonazistas se mobilizam em massa contra os muçulmanos e que eles representam hoje uma ameaça política de memória sinistra? Enfim, é preciso lembrar que muçulmanos e numerosos locais de culto foram alvo de atos criminosos em reação ao atentado contra Charlie Hebdo?

Em todo caso e no que nos diz respeito, a luta contra o racismo de Estado, o imperialismo e o sionismo permanecem nossa prioridade. E, nem Bougrab, nem Fourest, nem Le Pen, nem Sarkozy, nem Hollande, que encontram ai a oportunidade de comprar uma consciência a um bom preço, comungando com esta nova “União sagrada” ocidental - os grandes dirigentes da Europa imperialista, declararam sua participação - não nos farão desviar dessa via.

Nós devemos enfrentar as consequências na Europa das manobras imperialistas pelo mundo e, particularmente, no Oriente Médio, do racismo e da relegação social. Nós devemos imperativamente romper com as soluções despolitizantes e desmoralizantes que fazem abstração das condições políticas e sociais que engendram e alimentam sem cessar essas violências. É a oportunidade de denunciar um sistema que apenas sabe produzir o horror.

Nós temos a honra de ser da linhagem de Frantz Fanon, Aimé Césaire, René Vautier, Angela Davis, Abdelkrim El Khattabi, Lalla Fatma N’Soumer… que sempre souberam assumir suas responsabilidades quando os maus ventos sopram. Nós somos da linhagem daqueles que não cedem nem diante da ameaça nem diante do humanismo balido. O que os novos papas da união nacional tentam fazer é reduzir a nada a possibilidade de uma solução política e continuar com “essa guerra declarada” que eles fingem denunciar.

De nossa parte, nós não participaremos da manifestação de domingo dia 11 de janeiro, pois não respondemos a nenhuma convocação e não marchamos atrás dos agentes da contra-revolução colonial, provocadores de desordem social e política, entre os quais a chanceler alemã, Angela Merkel, o presidente ucraniano, Petro Porochenko, amigo dos neonazistas de seu país, o criminoso Netanyahou, representante do Estado sionista e… Jens Stoltenberg, secretário geral da OTAN.

Nós temos, ao mesmo tempo, o espírito suficientemente lúcido para evitar a miragem do “todos juntos” emocional, da regressão política que vai gerar e que ameaça nossas resistências e o conjunto do campo político e também o coração suficientemente grande para participar de uma frente, a mais ampla possível, com todas as forças que não terão complacência com os assassinos e que continuarão a luta contra o racismo, o imperialismo e pela justiça. As forças que nunca se submeterão à agenda dos Estados que querem dominar o planeta.

Criemos a política, criemos a esperança coletiva!

Traduzido por Ana Catarina Zema de Resende